Professor Gilberto De Martino Jannuzzi

Professor Associado em Sistemas Energéticos - Associate Professor in Energy Systems
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Avaliação do Uso de Incentivos em um Programa de Iluminação Eficiente no Setor Residencial

Gilberto De Martino Jannuzzi e Vanice Ferreira dos Santos [1]

 

Resumo

  Este artigo apresenta os resultados de um programa de incentivo ao consumidor residencial para a quisição de lâmpadas eficientes. O programa foi implantado em 3 cidades do estado de São Paulo onde foram oferecidos diferentes níveis de incentivo seguindo a mesma estrutura (campanha informativa, produtos, pontos de venda e condições de participação). Os resultados mostram que para os níveis de incentivo mais altos são vendidas mais lâmpadas por dia bem como por consumidor e o total de economia de energia são maiores. Para a concessionária há atratividade nos 3 níveis de incentivo testados.

 

 

1. Introdução

  No Brasil, em 1994, o consumo total de eletricidade foi cerca de 240 TWh sendo o setor residencial responsável por 23%. Deste total, 16% a 17% é usado em iluminação e 4% na iluminação residencial. Este uso final responde, em grande parte, pela demanda no horário de pico do sistema elétrico sendo proprocionada em sua maior parte por lâmpadas incandescentes (JANNUZZI, 1994).

  A susbstituição das lâmpadas incandescentes por lâmpadas mais eficientes proporciona resultados imediatos, simplicidade de operação e tem se mostrado atraente em termos de custos e benefícios (JANNUZZI & SANTOS, 1995) considerando os custos marginais de expansão do sistema elétrico.

  A mudança de tecnologia no uso final requer investimentos e conhecimento pelo consumidor, constituindo-se nas principais barreiras para a melhora do uso de energia. Na iluminação, as lâmpadas fluorescentes compactas (LFCs) oferece aumento na eficiência energética comparada às incandescentes, entretanto, o seu preço, de 10 a 20 vezes maior, e as baixas tarifas não propiciam a aquisição desses produtos pelos consumidores residenciais. Da mesma forma, para encorajar a penetração das lâmpadas mais eficientes as empresas de energia européias e norte-americanas e outras agências têm oferecido uma variedade de programas de incentivos (ETO et al. , 1994; HIRST, 1994).

  Este artigo apresenta os resultados da penetração de lâmpadas fluorescentes compactas no segmento residencial através de um programa de incentivo implantado em 3 cidades do estado de São Paulo, Brasil, por uma concessionária de distribuição de energia elétrica. No programa foram testados diferentes níveis de desconto oferecido pela concessionária para a aquisição de lâmpadas fluorescentes compactas tendo como base a mesma campanha publicitária, o mesmo número de pontos de venda e condições para compra.

 

 

2. O programa

2. 1. Desenvolvimento do programa

  O programa desenvolvido em escala piloto baseou-se em uma campanha de promoção e publicidade aplicada igualmente em 3 cidades onde foram oferecidos diferentes níveis de desconto em % para aquisição de lâmpadas mais eficientes pelos consumidores residenciais.

  A promoção constituiu-se de preços especiais oferecidos pelos fabricantes e descontos de 30, 60 e 70% sobre o preço final oferecido pela concessionária.

  A campanha de publicidade teve início 1 mês antes do período das vendas sendo reforçada durante o programa em cada cidade. Como peças de publicidade foram utilizados cartazes, faixas, veiculação de mensagens em rádios e jornais e folheto explicativo distribuído junto com a conta de luz. Dez dias antes do início das vendas foi eviado pelo correio um “cupom de desconto” para cada consumidor com o valor da porcentagem do desconto. A apresentação do “cupom” era obrigatória e permitia a aquisição de até 3 lâmpadas, servindo como mecanismo de controle da concessionária.

  Devido a disponibilidade de poucos recursos financeiros, o período de venda foi limitado a 30 dias ou até a comercialização de 10.000 unidades com desconto em cada cidade.

  A implantação do programa foi feita sequencialmente nas cidades de Americana, Marília e Franca envolvendo um total de 153.775 [2] consumidores. As cidades se assemelham em nível sócio-econômico, existência de meios de comunicação, apresentam disponibilidade de recursos humanos e físico por parte da concessionária para serem utilizados no programa. Outro fator é a distância geográfica entre elas que reduziria a influência da campanha local.

  O desenvolvimento do programa exigiu a parceria da concessionária com fabricantes de sistemas de iluminação eficientes e revendedores, cabendo a cada um:

  - concessionária: implantar o programa oferecendo recursos humanos e físico, promover a campanha de publicidade e subsidiar os consumidores;

  - fabricantes: fornecer produtos aos revendedores a preços especiais;

  - revendedores: realizar as vendas aos consumidores.

  Os fabricantes foram solicitados a participar do programa através de convite público direcionado às indústrias nacionais de lâmpadas e/ou reatores filiadas à ABILUX - Associação Brasileira da Indústria de Iluminação. Tomaram parte do programa 3 fabricantes de lâmpadas.

  Em cada cidade participaram como revendedores 1 supermercado e 1 loja especilaizada em materiais elétricos onde os consumidores tinham o “cupom de desconto” validado por funcionários da concessionária. A escolha dos revendedores foi feita com base na disponibilidade de espaço físico, volume de vendas, facilidade de acesso, localização geográfica distanciada, garantia de comercialização exclusiva dos produtos do programa durante o período da vendas e interesse do proprietário.

  Os revendedores acrescentaram aos preços fornecidos pelos fabricantes 6,3% relativo a impostos, não tendo lucro nos preços dos produtos.

  A participação e responsabilidades dos parceiros foram definidas através de convênios.

 

 

 

2.2. Produtos

  Foram comercializados 13 modelos de lâmpadas fluorescentes compactas para substituição das incandescentes de 60 e 100W. Os modelos aceitos para participar do programa foram testados segundo um critério de avaliação de iluminância definido pela concessionária. Na Tabela I estão apresentados os produtos comercializados e respectivos preços sem desconto.

 

Tab. I - Características dos produtos comercializados pelo programa e preços finais sem desconto.

Referência

Potência (W) [3]

Tipo reator

Substituição (W)

Preço (US$) [4]

01

25

magnético

60

16.06

02

18

magnético

60

18.13

03

18

magnético

60

22.04

04

19

eletrônico

60

29.84

05

22

eletrônico

60

29.84

06

22

eletrônico

100

29.84

07

27

eletrônico

100

33.70

08

32

eletrônico

100

35.00

09

15

eletrônico

60

35.65

10

23

eletrônico

100

35.65

11

15

eletrônico

60

38.89

12

20

eletrônico

100

41.49

13

20

eletrônico

100

41.49

 

 

3. Resultados

3.1. Vendas

  Os resultados referentes às vendas das lâmpadas para os 3 níveis de desconto estão apresentados na Tabela II e Figura 1.

 

Tab. II - Vendas para os 3 níveis de desconto.

Ítem

Americana (30%)

Marília (60%)

Franca (70%)

lâmpadas vendidas com desconto [5]

5.700

11.050

10.058

lâmpadas vendidas sem desconto

1.747

870

481

participação dos consumidores

5,0 %

8,5 %

5,3 %

n o . médio lâmp/consumidor

2,52

2,82

2,87

n o . compradores

2.196

3.956

3.482

 

  O nível de desconto influencia no volume e velocidade das vendas, ou seja, com 30% de desconto o programa teve a duração do período planejado, com 26 dias úteis (1 mês de vendas), 60% 17 dias e 70% 9 dias, tendo atingido nos dois ultimos nívies de desconto a venda de 10.000 lâmpadas. No 1 o . dia de vendas foram comercializados os maiores volumes, correspondendo a 11,5% do total para 30% de desconto, 17,6% para 60% e 23,2% para 70% de desconto. Este fato pode ser atribuído a expectativa gerada no consumidor pela campanha publicitária. (Figura 1.)

 

Fig. - 1. Volumes diários de venda para os diferentes níveis de desconto.

 

  Com o menor nível de desconto, 30%, foram vendidas as maiores quantidades de produtos sem subsídio dentro período planejado para o programa. Esses dados foram fornecidos pelos fabricantes participantes uma vez que essas vendas não foram controladas pela concessionária (Tabela II).

  O nível de desconto afeta o número o número médio de lâmpadas adquiridas por consumidor. Assim, com um preço menor os compradores passam a adquirir um número maior de produtos, havendo mais compradores com aquisição de 3 lâmpadas.

  Na análise do número médio de lâmpadas adquiridas por faixa de consumo verifica-se que há um aumento do número médio nas faixas de menor consumo com o aumento do nível de desconto (Tabela III).

 

 

 

Tab. III - Número médio de lâmpadas por faixa de consumo.

Consumo médio

Número médio

(kWh/mês)

Americana - 30%

Marília - 60%

Franca - 70%

1 - 50

2,47

2,71

3,00

51 - 100

2,47

2,75

2,91

101 - 150

2,35

2,63

2,76

151 - 200

2,49

2,84

2,82

201 - 250

2,46

2,94

2,84

251 - 300

2,51

2,90

2,95

301 - 400

2,66

2,87

2,97

> 400

2,65

2,88

2,98

 

 

3.2. Produtos

  O produto mais vendido apresentava o menor preço de todos os produtos do programa tendo como características potência total de 25W, reator magnético, possibilidade de troca do bulbo, indicado para substituição de lâmpadas incandescentes de 60W e vida útil de 5.000 horas. O segundo produto mais comercializado apresenta potência de 32W, reator eletrônico, incado para substituição de lâmpadas de 100W, não sendo o produto mais barato da linha eletrônica.

  Com o aumento do nível de subsídio tem-se o aumento da participação dos produtos da linha eletrônica que são mais caros. Na análise por faixa de consumo observa-se que nas faixas de maior consumo há uma maior penetração de produtos com reator eletrônico e com níveis de desconto maiores tem-se uma maior penetração desses produtos nas faixas de menor consumo.

  Quanto aos locais pretendidos para instalação desses produtos a sala/sala de TV é o mais declarado, estando a cozinha e quarto como opções subsequentes. A verificação do local de instalação foi feita pela concessionária através de pesquisa de campo cujos dados estão em fase de processamento.

 

 

3.3. Energia conservada

  Considerando o número médio de lâmpadas por consumidor, as potências das lâmpadas adquiridas e respectivas incandescentes indicadas para substituição, 3 horas de utilização e 65% de coincidência no horário de pico, foram feitas as estimativas da energia conservada e a demanda evitada por cidade com a substituição das lâmpadas, estando os resultados apresentados na Tabela IV.

 

Tab. IV - Potência média das lâmpadas adquiridas e substituídas por comprador e estimativas da energia conservada e demanda evitada.

Ítem

Americana (30%)

Marília (60%)

Franca (70%)

Potência adquirda (W)

60,28

66,86

67,10

Potência substituída (W)

198,70

207,12

221,80

Energia conservada (MWh/ano)

342,83

601,81

593,31

Demanda evitada (kW)

222,84

391,18

385,65

 

  O mix de produtos adquiridos em Americana proporcionou uma maior potência conservada por lâmpada, visto que esta potência diminui nas outras 2 cidades.

 

3.4. Conhecimento anterior do produto

  Foi observado através de dados obtidos junto aos consumidores no ato da compra que a grande maioria dos compradores não conheciam as lâmpadas fluorescentes compactas antes da promoção. Dos compradores que não tinham conhecinento prévio a maioria adquiriu 3 lâmpadas.

 

 

3.5. Análise de custo-benefício

  Sob a ótica da concessionária o programa apresentou atratividade para os 3 níveis de incentivo uma vez que o custo de conservar energia (CCE) é menor que o custo marginal de fornecimento de energia para o consumidor residencial. Na avaliação o CCE incluiu os gastos com o incentivo, administração do programa, campanha informativa e custos variáveis

  Considerando a perda de receita da concessionária com a substituição o programa apresenta benefícios sendo Benefício Anual Líquido (BAL) por lâmpada vendida de US$ 3.09 para 30% de desconto e US$ 2.45 para 70%, superiores à tarifa média.

  Na Tabela V estão apresentados os resultados do CCE e BAL para os diferentes níveis de subsídio.

 

  Tab. V - Custo da Energia Conservada - CCE (US$/kWh) e Benefício Anual Líquido - BAL (US$/lâmpada substituída).

Custo-benefício [6]

Americana (30%)

Marília (60%)

Franca (70%)

CCE total

0.09

0.10

0.10

BAL total

3.09

2.44

2.45

taarifa média

0.14

0.13

0.13

custo marginal

0.27

0.27

0.27

 

 

4. Conclusões

  Os resultados mostraram que o valor do incentivo, através do desconto no ato da compra, influenciaram a quantidade e velocidade das vendas e que o conhecimento prévio do produtos não interferiram na compra. O número de participantes poderia aumentar se mais lâmpadas fossem colocadas para venda.

  O preço ideal para aquisição das lâmpadas compactas fluorescentes deve estar situado entre 30 e 60% de desconto.

  A falta de produtos durante as promoções, apesar de mecanismos de garantia expressos nos convênios, foi o principal ponto negativo observado no programa.

  Os produtos a serem oferecidos com desconto devem ser analisados pela concessionária também sob os aspectos da potência conservada por produto, vida útil e possibilidade de substituição do bulbo, uma vez que são fatores importantes na análise de custo-benefício bem como para a continuidade da utilização do produto, visto que o investimento para troca do bulbo é menor. Neste sentido a concessionária poderia pensar em descontos diferenciados para produtos que proporcionem um maior retorno.

 

 

 

 

 

 

Agradecimentos

  Os resultados apresentados fazem parte do programa de avaliação sendo realizado pelos autores com o suporte financeiro da Companhia Paulista de Força e Luz - CPFL. Nós agradecemos a participação da Profa. Cicília W. Wada e Luz B. Camarena da Universidade Estadual de Campinas, responsáveis pela parte estatísitica, e Marcello M. Campos Filho e José K. Fugiwara da CPFL, responsáveis pela condução do programa.

 

Referências

JANNUZZI, G. M. & SANTOS, V. F. The costs and benefits of residential lighting programs in Brazil. In: 3RD EUROPEAN CONFERENCE ON ENERGY- EFFICIENT LIGHTING, Newcastle upon Tyne, England, 18-21/june/1995 - Proceedings , 1995. p. 171-176.

 

ETO, J.; VINE, E.; SHOWN, L.; SONNENBLICK, R. & PAYNE, C. The cost and performance of utility commercial lighting programs. Lawrence Berkeley Laboratory, Report LBL-34967 UC-350, Berkeley, USA. 1994.

 

HIRST, E. Evaluation of DSM programs and financial incentives. In: Regulatory incentives for Demand-Side Management, S. Nadel et al . (ed.), ACEEE, Washington, USA. 1994.

 

JANNUZZI, G. M. The establishment of an energy efficient residential lighting program: social realtions determining policy changes. Energy for Sustainable Development , 1(3):44-45, 1994.

[1] Universidade Estadual de Campinas, Dep. Energia, CP 6122, CEP 13083-970, Campinas, São Paulo, Brasil.

[2] Dados de 1994.

[3] Potência inclui perdas no reator.

[4] US$ = R$ 0,82 (01/05/95).

[5] A impossibilidade de interromper as vendas durante o horário de funcionamento dos estabelecimentos comerciais levou a exceder o limite de 10.000 lâmpadas.

[6] Foi considerada uma taxa de retorno de 12%.

 

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