por Gilberto De Martino
Jannuzzi
Os colapsos dos sistemas de energia em países desenvolvidos
são sinais de alerta, que apontam para o redirecionamento
do desenvolvimento tecnológico. Mas será que
estamos atentos a estes sinais? Será que estamos aproveitando
os recursos disponíveis para diminuir os riscos de
novos apagões ?
A seqüência de apagões em países
tão insuspeitos como Estados Unidos, Inglaterra, Itália,
Suécia, Dinamarca, começam a expor alguns limites
importantes do sistema de energia convencional, especialmente
dos sistemas de transmissão de eletricidade e também
das reformas promovidas nos mercados de energia pelo mundo
afora. Enquanto esses desastres aconteciam em lugares como
Brasil, Argentina, Chile, por exemplo, o problema era mais
uma indicação de nossa incompetência gerencial
e obsolescência tecnológica. No entanto, cresce
a percepção que tem coisa mais importante por
detrás desse modelo tecnológico, que merece
ser revisitado.
Na verdade, este é um ótimo momento para aperfeiçoar
a regulação do setor e explorar algumas opções
para novos desenvolvimentos e incentivos a tecnologias promissoras.
Os problemas de regulação de mercados de energia,
com relação a incentivos para antecipar investimentos
em infra-estrutura, especialmente na modernização
de linhas de transmissão e aumento de sua capacidade,
são causas parciais dos apagões, na maioria
dos casos. Em muitos países, os investimentos em geração
simplesmente não estão sendo acompanhados por
investimentos em transmissão.
Além desse aspecto, existem importantes áreas
para pesquisa, desenvolvimento e comercialização
de novas tecnologias e processos, que podem contribuir para
diminuir os riscos de novos apagões.
Por incrível que pareça as reformas no Brasil
propiciaram condições muito interessantes para
aumento de investimentos em eficiência energética
e pesquisa e desenvolvimento na área de energia elétrica.
Hoje, as empresas de distribuição de eletricidade
do país são obrigadas a investir 0,5% da sua
receita anual em programas de eficiência energética
e outros 0,5% em programas de pesquisa e desenvolvimento.
As empresas de geração e transmissão
são obrigadas a investir 1% de suas receitas em programas
de pesquisa e desenvolvimento.
A metade dos recursos para pesquisa é executada diretamente
pelas concessionárias de eletricidade sob supervisão
da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL).
Mas será que estamos aproveitando os recursos disponíveis
para diminuir os riscos de novos apagões e nos preparar
para o futuro?
Entre as tecnologias de interesse, vale destacar, por exemplo,
as de geração descentralizada ou geração
distribuída. Existe uma profusão de sistemas
de geração de eletricidade de pequeno porte,
que podem ser colocados muito próximos aos centros
de consumo, diminuindo as necessidades de sistemas de transmissão
e, conseqüentemente, diminuindo perdas e custos. Ainda
são necessários esforços de pesquisa
e desenvolvimento em muitas dessas tecnologias, que incluem
turbinas a gás (especialmente as chamadas micro-turbinas),
sistemas de co-geração, sistemas de geração
híbridos (como o eólico-gás) e também
sistemas de armazenagem de energia. Outro destaque seriam
as tecnologias mais eficientes nos setores de uso final e
aqui se incluem os equipamentos eletrodomésticos, iluminação,
motores, etc. Equipamentos mais eficientes possibilitam proporcionar
o mesmo nível de conforto e serviços com menores
consumo de energia. Pesquisas realizadas na Universidade Estadual
de Campinas (Unicamp) apontam grandes possibilidades de redução
em equipamentos - como a geladeira, resultado em reduções
de consumo entre 20-40% - apenas com melhorias no projeto
e na qualidade da energia fornecida a esses equipamentos.
A implementação de programas de eficiência
energética, em determinadas regiões, pode contribuir
de maneira significativa para aliviar áreas congestionadas
do sistema de transmissão a custos muitas vezes mais
baixos que a expansão desses sistemas.
E existem mais possibilidades interessantes para melhorar
a eficiência de uso de energia, que ainda necessitam
de maiores desenvolvimentos, como sistemas combinados de calor,
frio, força motriz, juntamente com sistemas de comunicação
e distribuição de energia. Esses sistemas irão
permitir maior controle e racionalização do
consumo de energia em equipamentos.
Ainda a pesquisa em novos materiais supercondutores é
promissora, ao viabilizar o transporte de mais energia elétrica,
aumentando a capacidade das linhas de transmissão e
diminuindo as perdas, de maneira muito significativa.
Além de tudo isso, existe, é claro, a necessidade
de manter, reparar e expandir o sistema de transmissão
existente, incorporando, sempre que possível, modernos
dispositivos, que permitem maior controle e acompanhamento
em tempo real e sua integração com sistemas
de geração distribuída e fontes renováveis.
Ao garantir investimentos para eficiência e para pesquisa
e desenvolvimento, o Brasil soube aproveitar as reformas para
introduzir avanços regulatórios de suma importância.
No entanto, os investimentos em eficiência energética
e pesquisa e desenvolvimento tendem a otimizar a visão
particular de cada empresa e não de um sistema interligado.
A ANEEL e o Fundo Setorial de Energia (CTEnerg) poderiam ter
um papel muito mais estratégico na coordenação
desses investimentos. Afinal, são cerca de R$ 350 milhões
ao ano, que potencialmente podem ser aplicados em programas
de eficiência energética e pesquisa na área
de energia elétrica.