Pascal, Blaise (1623-1662)

Elaborado por: Priscila Phelippe de Mello - RA 931899

Dados Biográficos

Blaise Pascal nasceu em Clermont-Ferrand, Puy-de-Dôme, França em 19 de junho de 1623 e morreu em Paris em 19 de agosto de 1662.

A mãe de Pascal morreu quando ele tinha apenas três anos. Em 1631, seu pai Étienne deixou o cargo de juiz e mudou-se para Paris com seus filhos Gilberte, Blaise e Jacqueline. Pascal nunca foi à escola ou universidade, tendo sido educado por seu pai .

A forma heterodoxa como foi criado combinada com precocidade cultivou em Blaise um espírito intelectual independente e uma certa arrogância.

O jovem Pascal começou seus estudos científicos por volta de 1635 com a leitura dos Elementos de Euclides. As suas habilidades excepcionais imediatamente provocaram admiração geral. Pascal acompanhava seu pai às reuniões na "Académie Parisienne" logo depois de sua fundação por Mersenne em 1635 e lá desempenhou um papel importante desde o princípio. Em 1639, Gerard Desargues publica seu Brouillon project d'une atteinte aux é'vénemens des rencontres du cone avec un plan; mas sua originalidade, seu vocabulário e sua recusa de usar os símbolos algébricos cartesianos frustrou a maioria dos matemáticos contemporâneos. Como o único a apreciar a riqueza do seu trabalho, Pascal se tornou o principal discípulo de Desargues na geometria.

Em 1646, toda a família se converteu para o jansenismo, uma forma rigorosa do Catolicismo baseado na rejeição dos valores mundanos em favor de uma vida de serviço a Deus e aos próximos. O efeito desta primeira conversão de Blaise é problemático. Sua irmã Jacqueline decidiu se tornar freira. Em 1647, ela e Blaise mudaram-se para Paris e quando o pai morreu em 1651 ela entrou para o centro espiritual do jansenismo, em Port-Royal. Pascal, cuja irmã mais velha já havia se casado, se sente só no mundo. Foi então que ele conheceu um período de vida mundana; parecia que o ressentimento de ter sido abandonado por Jacqueline tornou-se ressentimento com a vocação dela e com as exigências aparentes de Deus. Doente desde muito tempo, atraído para Deus e estimulado pela irmã Jacqueline, sentiu-se, na noite de 23 de novembro de 1654, tomado de verdadeiro transe místico, escrevendo, então, no seu diário: "Alegria, alegria, lágrimas de alegria. Renúncia total e suave..." . Segundo consta, foi uma reconciliação pessoal com Cristo, quem ele sentia ter traído. Em janeiro de 1655, ele se retirou por algumas semanas em Port-Royal-des-Champs, para procurar direção espiritual e ele nunca ficou entre os solitários que viviam lá. Pelo contrário, ele juntou-se a amigos em Paris para vários trabalhos práticos, entre eles o primeiro serviço de ônibus na Europa, inaugurado em 1662 em Paris.

Um ano depois fez outro retiro, quando foi convencido de encarregar-se da defesa do líder jansenista Antonie Arnauld o qual foi expulso da Faculdade de Teologia na Sorbonne por ter lutado contra os jesuítas. A resposta imediata de Pascal foram as 18 "Provinciais" (Lettres écrites à un provincial ), em que justifica Arnauld, de fato e de direito, na questão da graça, atacando a moral condescendente dos jesuítas. São obras-primas de clareza, ironia e indignação, que muito contribuíram para a literatura francesa, além de assegurar a condenação dos jesuítas mais tarde.

Este caso gerou uma polêmica que seria difícil Pascal superar antes de dirigir-se ao grande público de novo, desta vez com Apology for the Christian Religion. Além do trabalho matemático sobre ciclóides (1658), este projeto absorveu suas energias intelectuais até sua morte. Sua saúde era tão precária que nos seus últimos anos nenhum trabalho seu chegou ao estado final e a maioria estava apenas fragmentada. A primeira publicação destes papéis, em 1670, teve o título Pensées pelo qual eles são conhecidos até hoje. Este é o seu trabalho mais difundido. Constitui uma das obras-primas da literatura francesa.

Pascal dividiu o conhecimento humano em três ordens: do corpo, da razão e do coração. Uma característica dos seus argumentos é a rigorosa limitação imposta à razão, mesmo na ciência natural, mas especialmente na religião. É dele a célebre frase: "O coração tem razões que a própria razão desconhece." Nunca desacreditou da razão, mas, como cientista, preferia o método indutivo na busca da verdade física, enquanto na vida religiosa e prática preferia guiar-se pelo senso comum e pelos sentimentos místico-religiosos e não por abstrações racionais. Foi um aristocrático na vida, na cultura e até na religião. Ele continua a exercer enorme influência num grande público, estendendo até o Japão.

Entre as suas defesas da religião cristã, figura o célebre argumento da aposta; afirmava que se devia apostar na vida imortal prometida pelo Cristianismo, pois ganhando-se a aposta, tudo estava ganho, e perdendo-se, nada se perdia na realidade. Tratando das fraquezas e limitações e das insignificâncias do homem, descreveu a sua posição no universo com a célebre passagem dos dois infinitos: o infinitamente grande e o infinitamente pequeno; a razão humana falece ao defrontar-se com os dois infinitos e o homem, incapaz de compreender o sentido do mundo, pode unicamente dirigir a sua fé a Deus. Nos Pensées, são frequentes as alusões ao papel desempenhado na História pelos fatos insignificantes. Tornou-se famosa a sua alusão ao nariz de Cleópatra: se ele fosse mais curto, ficaria mudada a face do mundo. Tinha um conceito relativista sobre a moral e a verdade. Tratando dos prazeres mundanos, Pascal antecipou alguns conceitos da Psiquiatria moderna. Afirmou, entre outras coisas, que o homem brinca para esquecer a morte e que toda a sua grandeza está em seu pensamento.

Contribuições Relevantes

Geometria Projetiva

Fiel ao significado da nova concepção das crônicas de Desargues, Pascal adotou as idéias básicas do Brouillon project: a introdução dos elementos no infinitésimo; a definição de uma cônica como qualquer secção plana de um cone com uma base circular; o estudo das cônicas como círculos em perspectiva; e a involuta determinada em qualquer linha reta por uma cônica e os lados opostos de um quadrilátero inscrito. Em junho de 1639, Pascal fez sua primeira grande descoberta, o "hexagrama místico" de Pascal; de acordo com ele, os três pontos de intersecção dos pares de lados opostos de um hexágono inscrito numa cônica são colineares. Logo depois ele viu a possibilidade de basear um estudo de Cônicas nesta propriedade. Depois ele escreveu Essay pour les coniques , um livro com poucas cópias publicadas. Planos para mais pesquisa, ilustrados com declarações de proposições típicas que ele havia descoberto, o Essay constituía um esboço do grande tratado das cônicas que ele acabara de conceber e começava a preparar.

Mais tarde ele obteve a solução geométrica definitiva para o problema de Pappus. Em 1654, Pascal praticamente terminou o tratado, baseado em apenas uma proposição - da qual ele teve a idéia antes de completar 16 anos. Ele também mencionou alguns problemas geométricos especiais para o qual seu método projetivo poderia ser utilmente aplicado: círculos ou esferas definidos por três ou quatro condições; cônicas determinadas por cinco elementos (pontos ou tangentes); lugares geométricos compostos por linhas retas, círculos ou cônicas; e um método geral para perspectiva. O tratado nunca foi publicado e parece que apenas Leibniz viu o manuscrito e, os detalhes mais precisos são conhecidos por intermédio dele. Embora os poucos elementos do tratado preservados por Leibniz não retratem seu conteúdo completo, eles são suficientes para mostrar a riqueza e a clareza da concepção de Pascal. É razoável assumir que a publicação deste trabalho teria apressado o desenvolvimento da geometria projetiva.

Cálculos Mecânicos

Ansioso para ajudar seu pai, cujas obrigações exigiam um grande número de contas, Pascal procurou mecanizar as duas operações elementares da aritmética, adição e subtração. No final de 1642 ele começou o projeto da máquina que iria reduzir estas operações ao simples movimento de engrenagens. Depois de resolver o problema teórico, restou a ele produzir a máquina que deveria ser rápida, confiável e fácil de operar. A construção, entretanto, se tornou extremamente difícil com as imprecisas e rudimentárias técnicas disponíveis. Neste empreendimento, Pascal demonstrou notável senso prático, grande preocupação com a eficiência e inegável obstinação. Supervisionando uma equipe, ele construiu o primeiro modelo em poucos meses mas, julgando este insatisfatório, ele resolveu melhorá-lo. Os problemas encontrados o desencorajaram e acabou por abandonar o projeto. No começo de 1644, o incentivo de muitas pessoas o fizeram voltar à máquina de calcular e depois , segundo ele, "de mais de cinquenta modelos" , finalmente produziu o modelo definitivo. Ele próprio organizou a fabricação e a venda das máquinas.

É difícil estimar o sucesso alcançado pela máquina de calcular de Pascal, a primeira do gênero a ser vendida. Embora seu mecanismo fosse complicado, a máquina funcionava de uma maneira relativamente fácil - pelo menos as duas operações a que estava destinada. Seu alto preço, entretanto, limitava a venda e causou mais curiosidade do que interesse em sua utilidade. Sete máquinas existem em público e em coleções particulares. Em 1652, ele demonstrou seu uso durante uma conferência e deu uma de presente à rainha Christina da Suécia.

Cálculo das Probabilidades

O ano de 1654 foi extremamente proveitoso para Pascal. Ele não só apenas refinou seus tratados em geometria e física como também conduziu seu principal estudo em aritmética, análise combinatória e o cálculo da probabilidade.

Trocou cartas com Fermat que tratavam das regras que governavam os jogos de azar. A discussão entre eles girava em torno de dois problemas principais. O primeiro preocupado com a probabilidade de um jogador obter uma certa face de um dado num certo número de jogadas. O segundo, mais complexo, consistia em determinar, para qualquer jogo de azar envolvendo muitos jogadores, o valor das apostas que iria retornar a cada jogador se o jogo fosse interrompido. Desta correspondência veio o triângulo aritmético (o triângulo de Pascal) e uma brilhante formulação do modo como a probabilidade poderia ser calculada, o que Pascal chamou da "matemática das chances".

A aplicação deste trabalho à estatística é evidente e ele pode ser visto como um passo para o cálculo (descoberto uns 30 anos depois por Newton e Leibniz).

Como E. Coumet realçou, a preocupação de Pascal, além do aspecto puramente matemático dos problemas, era vincular decisões e eventos incertos. Seu propósito não era definir o status matemático do conceito de probabilidade - um termo que ele não empregou - mas resolver o problema de dividir as apostas. Este esforço deve ser visto num contexto de discussões conduzidas por juristas, teólogos e moralistas nos séculos dezesseis e dezessete a respeito das consequências das chances nas mais variadas circunstâncias da vida individual e em comunidade.

- O triângulo de Pascal

É um arranjo de números, usado para calcular coeficientes binomiais. Ele é construído somando-se dois números adjacentes numa linha e colocando a soma entre eles, na próxima linha abaixo.

É conveniente "puxá-los" para a esquerda do triângulo e chamar as linhas de n = 1,2,.. e as colunas de r = 0,1,2,.. . Cada entrada é a soma do número acima com o da sua esquerda acima. A entrada na n-ésima linha e na r-ésima é chamada de C(n,r). Deste modo, C(5,2) = 10.

Triagulo de Pascal

r =>
0
1
2
3
4
5
n =0
         
n =1
1
       
n =2
1
2
1
     
n =3
1
3
3
1
   
n =4
1
4
6
4
1
 
n =5
1
5
10
10

Os números C(n,r) são chamados de coeficientes binomiais, já que eles aparecem no teorema binomial. A fórmula familiar

(x + y)2 = x2 + 2.xy + y2

tem coeficientes 1,2,1 do lado direito. Estes são precisamente a linha n = 2 da figura. Os coeficientes podem ser obtidos diretamente pela fórmula:

C(n, r) = n! / r!.(n - r)!

Estática dos Fluidos e o Problema do Vácuo

O interesse em física foi despertado pelas experiências de Evangelista Torricelli em 1644, e por sete anos ele conduziu uma série de experimentos para testar e finalmente refutar a visão aceita que a natureza abomina o vácuo. Tradicionalistas acreditavam nisto pela autoridade de Aristóteles, mas Pascal tinha cabeça aberta suficiente para testar o axioma e chegar a inesperadas conclusões. Os resultados são embasados nos papéis sobre pressão barométrica ( On the Weight of the Atmosphere ) e a pressão hidráulica (On the Equilibrium of Liquids).

Não menos significativo que estes resultados, é o conjunto de experiências organizadas em 1648 para medir a pressão barométrica simultaneamente em diferentes altitudes. Tubos de vidro de vários tamanhos foram fabricados, alturas ao longo das montanhas de Puy-de-Dôme em volta de Clermont cuidadosamente medidas, condições climáticas anotadas e leituras dos instrumentos checadas duas vezes. Tudo isso é uma utilização do método experimental. Contra críticas, Pascal defendeu que as evidências de dados experimentais tem mais autoridade nas ciências naturais do que o peso das tradições. O prefácio do inacabado Treatise on the Vacuum (1651) fala disso convincentemente e faz comparação com o respeito servil das suas críticas aos Jesuítas pela tradição na ciência com as inovações deles em teologia, um assunto corretamente dependente da autoridade da revelação, das Escrituras e dos Padres.

O Princípio de Pascal

É um importante princípio da estática dos fluidos, que se enuncia da seguinte maneira: "Toda variação de pressão se transmite integralmente em um líquido incompressível em equilíbrio". Este princípio fundamental da Hidrostática, que diz ser a diferença de pressão entre dois pontos A e B da massa líquida igual a

pA - pB = h.d.g

Se, por um processo qualquer , aumentar-se a pressão em um ponto A do líquido, aumenta-se do mesmo valor a quantidade em um ponto B, qualquer, do líquido. A aplicação mais direta deste princípio é a prensa hidráulica, com a qual se consegue um grande multiplicação de força.

O Cálculo dos Indivisíveis e o Estudo dos Problemas Infinitesimais

Entre 1658 e 1659 dedicou a maior parte do seu tempo aprimorando a "teoria dos indivisíveis", o precursor dos métodos do cálculo integral. Esta teoria lhe permitiu estudar os problemas que envolviam infinitesimais: cálculo de áreas e volumes, determinação dos centros de gravidade e retificação de curvas.

A primeira vez que Pascal se referiu ao método dos indivisíveis foi no trabalho aritmético em 1654. Ele observou que com os resultados da soma de potências numéricas era possível obter a solução de certos problemas. Por exemplo, ele explicou o conhecido resultado da integral de xn para todo n, na notação moderna.

No começo de 1658, Pascal acreditava que havia aprimorado o cálculo dos indivisíveis, refinando seu método e estendendo seu campo de aplicação. Convencido de que desta forma havia descoberto a solução para muitos problemas infinitesimais de ciclóides, ele resolveu desafiar outros matemáticos a resolver estes problemas. Numa circular sem assinatura distribuída em junho, Pascal explicou as condições do torneio e fixou a data de primeiro de outubro para seu encerramento. Muitos matemáticos da época participaram do desafio com interesse. Suas soluções foram consideradas incompletas e eles foram eliminados, o que lhes causou raiva, principalmente pelo preconceito. No final do torneio, Pascal publicou suas próprias soluções.

Pascal se inspirou em Arquimedes para solucionar o cálculo dos indivisíveis; era baseado nos fundamentos geométricos. As características mais notáveis do seu trabalho, que não foi terminado, são a importância da determinação dos centros de gravidade, o papel crucial das somas triangulares e as considerações estáticas, seu rigor estilístico e elegância, e o uso de uma linguagem geométrica tão limpa e precisa que compensa a falta de simbolismo geométrico. Entre as contribuições do trabalho estão a descoberta da igualdade da curvatura de um ciclóide generalizado e de uma elipse; o aprofundamento do conceito de indivisível; o primeiro passo em direção ao conceito de integral definida e a determinação de suas propriedades fundamentais; e o recurso indireto de certos métodos de cálculo, como a integração por partes. Assimiladas e exploradas por seus sucessores, estas inovações contribuíram para a elaboração de métodos infinitesimais. Entretanto, a sua maior contribuição aparece implicitamente no uso do triângulo característico. Leibniz afirmou que os escritos de Pascal a respeito do triângulo o estimularam. Este testemunho de um dos criadores do cálculo infinitesimal indica que o trabalho de Pascal marca uma importante transição do cálculo dos indivisíveis para o cálculo integral. Apesar disso, Pascal foi incapaz de transcender a natureza específica de suas concepções. Não conseguiu desenvolver os resultados que ele obteve nem utilizar o efeito completo e a generalidade dos métodos implícitos. Esta falha parcial se deve a duas causas: sua recusa em utilizar o simbolismo algébrico cartesiano; e sua preocupações místicas que o levavam a interromper suas pesquisas logo depois que as começava.

Em 1659, ficou gravemente doente e abandonou a maior parte de seus empreendimentos para rezar.

Pascal foi uma pessoa complexa cujo orgulho constantemente lutava contra um profundo desejo de se submeter a negação agostiniana. Um criador de polêmicas, um moralista e escritor, ele também era um cientista ansioso em ajudar a resolver os problemas de sua época. Foi capaz de sistematizar muitos campos da ciência e fazer muitas contribuições aos mesmos. Foi filósofo, escritor, matemático e físico; sem dúvida um dos maiores cientistas do século dezessete.

 
Bibliografia

Dictionary of Scientific Biography - Vol. 10
Enciclopédia Barsa - Vol. 10
Encyclopedia Britannica Editores Ltda. Ed.1967
Encyclopedia Americana - Vol. 11
Encyclopedia Brasileira Mérito - Vol. 15
Enciclopedia Delta Larousse - Vol. 7